O LEGADO DE ZÉ CELSO
É para mim um triste dia. Convivi com Zé por 4 anos quase diuturnamente pois, trabalhar no Oficina era viver em comunidade, partilhar alimento, idéias,, multiplicar sonhos e compartilhar a vida. Aprendi demais sobre ser teatro, A – Tuar, voar, e domar as circunstâncias nem sempre favoráveis. Meu amigo, irmão, diretor (costumava me chamar pelo nome de um personagem que fiz: Eduleia) e também me dirigiu em A Gaivota, e na primeira temporada e versão de Os Sertões. Certamente agora vai se misturar no firmamento e, ver a terra a rodar… A rodar … A saudade dele será eterna como o Zé já é eterno na cena do Teatro Brasileiro. EVOÉ JOSÉ CELSO MARTÍNEZ CORREA!
Idelene Aidê do Amaral
Zé Celso deixa legado de arte que revolucionou política e costumes
Dramaturgo encarou a ditadura e foi perseguido por suas montagens
Por Flávia Albuquerque – Repórter da Agência Brasil – São Paulo
Foto de Akemi Nitahara/Agência Brasil
O mais longevo dramaturgo em atividade, Zé Celso Martinez, que morreu na quinta-feira (6 de julho de 2023), deixa o legado de uma arte que revolucionou a política e os costumes. Ele encarou a ditadura militar e foi perseguido por suas montagens dionisíacas. Zé Celso foi preso, torturado e exilado, e produziu documentários sobre as revoluções portuguesa e moçambicana. O documentário Zé Celso: tupy or not tupy lembra que ele trabalhou com grandes nomes das artes, como Augusto Boal, Chico Buarque, Sérgio Britto, Raul Cortez e Pascoal da Conceição.
José Celso Martinez Corrêa nasceu em Araraquara no ano de 1937. Em 1955 entrou para o curso da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, profissão que nunca exerceu. Entretanto no período em que esteve no Largo São Francisco formou o Teatro Oficina e foi ali que seus primeiros textos Vento Forte para Papagaio Subir (1958) e A Incubadeira (1959), foram encenados.
No início da década de 60, ele se profissionaliza, e a sede do grupo é transferida para o teatro da Rua Jaceguai, onde três anos depois Zé Celso dirigia Pequenos Burgueses, de Máximo Gorki, peça de sucesso que ganhou diversos prêmios, mas que foi censurada no ano seguinte, quando o Brasil mergulhou na ditadura militar. Após um incêndio, o teatro da Rua Jaceguai foi reformado e a primeira montagem dessa nova fase foi O Rei da Vela, em 1967, com base num texto escrito por Oswald de Andrade na década de 30, também encenada por Zé Celso.
A partir de 1968, o grupo monta Roda Viva, Galileu Galilei e Na selva das cidades. Depois disso, Zé Celso se dedicou ao filme O Rei da Vela e enfrentou um período de crise, sofrendo com a repressão. Em 1974, chegou a ser preso, sendo solto depois de 20 dias, e se exilou em Portugal, onde fez o filme O Parto, por ocasião da Revolução dos Cravos. No ano seguinte, foi a Moçambique, onde filmou a independência do país. Zé Celso voltou para São Paulo em 1978 e retomou o trabalho à frente do Oficina.
Nos anos 80, o ator e diretor fez um intervalo nas produções, mas passou a lutar pela permanência da companhia no local, onde já havia se consolidado, já que, em 1982, o dono do quarteirão onde o imóvel está localizado, o Grupo Silvio Santos, anunciou a construção ali de um shopping center, gerando mobilização dos artistas junto à sociedade civil e autoridades governamentais. O tombamento do espaço cênico do Oficina como patrimônio histórico da cidade de São Paulo contribuiu para a resistência contra os objetivos do grupo.
O diretor trouxe ainda a construção e desconstrução do Arraial de Canudos (BA), tombado pela guerra de 1897, embate do Exército com os sertanejos liderados por Antônio Conselheiro. Fazem parte dessa epopeia musical A terra (2002), O homem – parte 1 – do pré-homem à re-volta (2003), O homem – parte 2 – da re-volta ao trans-homem (2003), A luta – parte 1 (2005) e A luta – parte 2 (2006), sempre com cerca de 50 artistas em cena, entre músicos, o núcleo de atores e as crianças e adolescentes do projeto comunitário Bexigão, referência ao bairro do Bexiga, onde fica o Oficina.
Uma das características dos espetáculos de Zé Celso é a encenação para o grande público, de graça, ao ar livre ou em grandes espaços. Um exemplo desse formato é As Dionisíacas, conjunto de quatro peças que percorreu sete capitais ao longo de 2010. As apresentações ocorriam sempre em estádios, com entrada franca.
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